A reaplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2025 começou na terça-feira, 16 de dezembro, e se estendeu até quarta-feira, 17 de dezembro, em todo o território nacional. Destinada exclusivamente aos candidatos que não puderam fazer a prova nos dias regulares — 9 e 16 de novembro de 2025 — por motivos fora de seu controle, a reaplicação foi uma resposta logística e humanitária do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), órgão vinculado ao Ministério da Educação. Nem todos os que pediram reaplicação tiveram o direito garantido. A seleção foi rigorosa, baseada em critérios previstos no edital: doenças infectocontagiosas como covid-19, sarampo, meningite e tuberculose; ou desastres naturais comprovados, como o tornado que atingiu Rio Bonito do Iguaçu, no Paraná, em 7 de novembro — um dos mais violentos já registrados no estado. Mas o que mais chamou atenção foi o adiamento em Belém, Ananindeua e Marituba, no Pará, onde a prova foi remarcada entre 30 de novembro e 7 de dezembro por causa da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP30). A cidade sediou o evento global, e o Inep decidiu priorizar a segurança e a logística da conferência, mesmo que isso significasse adiar a prova de milhares de estudantes.
Quem teve direito à reaplicação — e quem não teve
O Inep recebeu mais de 28.000 pedidos de reaplicação. Apenas 14.732 foram aprovados. A regra era clara: só quem comprovou impedimento no dia da prova original — e não por simples estresse ou falta de preparo — foi contemplado. Candidatos que tiveram problemas de transporte, como ônibus quebrados ou estradas interditadas por enchentes, só tiveram direito se houvesse decreto oficial de emergência municipal. Já os que ficaram doentes tiveram que apresentar atestado médico com código da CID-10 e, em casos de doenças contagiosas, laudo de laboratório. Curiosamente, muitos pedidos foram negados por falta de documentação, mesmo quando o candidato estava realmente doente. "Foi um processo cruel, mas justo", disse uma fonte interna do Inep, que pediu anonimato. "Nós não podemos abrir precedente para qualquer reclamação. Senão, o exame vira um jogo de sorte".
Enem PPL: a prova que ninguém vê, mas que muda vidas
Na mesma semana, o Inep aplicou o Enem PPL — voltado para pessoas privadas de liberdade ou sob medida socioeducativa — em 427 unidades prisionais e centros de internação em todos os estados. As provas foram idênticas às dos candidatos comuns, com os mesmos cadernos de questões e o mesmo tempo de aplicação. A diferença? Ninguém as vê. Ninguém fala sobre elas. Mas são essas provas que, em alguns casos, são a única porta de saída para jovens que passaram anos sem acesso à educação formal. Em 2024, 12% dos inscritos no Enem PPL conseguiram ingressar no ensino superior. Em 2025, a expectativa é que esse número suba para 15%. "É a única chance que muitos têm de mudar o rumo da vida", diz a educadora Maria do Carmo, coordenadora do projeto "Acesso à Justiça" em Pernambuco. "Sem o Enem PPL, esses jovens ficam presos não só nas celas, mas no ciclo da exclusão".
Um precedente histórico: o caso do Ceará e o direito de ver a prova
Em 2011, um estudante de Fortaleza, no Ceará, entrou com uma ação contra o Inep após não conseguir entender por que sua redação recebeu nota baixa. Ele pediu acesso à prova corrigida e o direito de recorrer. A 8ª Vara da Justiça Federal do Ceará concedeu liminar. O Inep recorreu, alegando que o exame era "um instrumento de avaliação científica, sem caráter classificatório". Mas o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), com sede em Recife, decidiu de forma histórica: o estudante tinha direito. O Ministério Público Federal (MPF) entrou com parecer afirmando que "é lamentável, sob todos os aspectos, a realização de um exame nacional sem transparência". O resultado? Em 2012, o Inep assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) garantindo vista das provas e direito a recurso. Mas o que muitos esquecem é que esse direito não foi retroativo. A decisão de 2011 foi um marco — não um presente. E isso ainda ecoa hoje.
O que muda agora? O impacto real da reaplicação
As notas da reaplicação do Enem 2025 serão divulgadas em 23 de janeiro de 2026, junto com as dos candidatos que fizeram o exame nos dias regulares. Mas o impacto vai além da nota. Para quem perdeu a prova por causa de um tornado, por uma doença que o deixou de cama ou por um atraso de transporte que ninguém previu, a reaplicação é uma segunda chance — e não um privilégio. Ela representa o reconhecimento de que o sistema educacional não pode ser rígido demais. "A educação não é um algoritmo", diz o professor José Luiz, especialista em avaliação educacional da Universidade de São Paulo. "Ela é feita de pessoas. E pessoas têm crises, desastres, momentos de fragilidade. O Enem não pode ignorar isso".
O que vem a seguir
Em 2026, o Inep promete revisar os critérios de reaplicação, especialmente para desastres naturais, que estão se tornando mais frequentes. Há discussões internas para criar um "canal de emergência" para casos como o de Rio Bonito do Iguaçu — onde o município inteiro ficou sem energia por dias. Além disso, o órgão estuda a possibilidade de permitir que candidatos que tiveram problemas durante a prova — como falhas no sistema de identificação biométrica — possam solicitar reaplicação parcial, não apenas total. Ainda não há prazo, mas a pressão está crescendo. E com razão.
Frequently Asked Questions
Quem teve direito à reaplicação do Enem 2025?
Apenas candidatos que comprovaram impedimento nos dias 9 ou 16 de novembro de 2025 por doenças infectocontagiosas (como covid-19, sarampo ou meningite) ou desastres naturais com decreto oficial — como o tornado em Rio Bonito do Iguaçu (PR) — puderam fazer a reaplicação. Também foram contemplados os inscritos de Belém, Ananindeua e Marituba (PA), cujas provas foram adiadas por causa da COP30. Mais de 14 mil pessoas foram aprovadas entre 28 mil pedidos.
Por que o Inep não aceitou todos os pedidos de reaplicação?
O Inep exige comprovação documental rigorosa: atestado médico com CID-10, laudos de laboratório ou decretos municipais de emergência. Muitos pedidos foram negados por falta de documentos, mesmo quando o candidato estava realmente impedido. A instituição argumenta que, se aceitasse qualquer justificativa, o exame perderia sua integridade. A regra é dura, mas uniforme.
O Enem PPL tem a mesma dificuldade que o exame regular?
Sim. As provas do Enem PPL são idênticas às aplicadas aos candidatos comuns, com os mesmos cadernos de questões e tempo de aplicação. A única diferença é o local: dentro de unidades prisionais e socioeducativas. Em 2024, 12% dos inscritos no Enem PPL conseguiram entrar na universidade. Em 2025, a expectativa é de aumento para 15%, graças a melhorias na logística e no apoio pedagógico.
O que mudou após o caso do estudante do Ceará em 2011?
Antes de 2011, o Inep não permitia que candidatos vissem suas provas ou recorressem de notas. A decisão do TRF-5 obrigou o órgão a assinar um Termo de Ajustamento de Conduta com o MPF, garantindo acesso às provas e direito a recurso a partir do Enem 2012. Mas o direito não foi retroativo. O caso foi um marco jurídico: reconheceu que o Enem, por ser porta de entrada para o ensino superior, exige transparência.
A reaplicação do Enem 2025 vai afetar as notas dos outros candidatos?
Não. As notas da reaplicação são corrigidas e escalonadas separadamente, mas usam a mesma metodologia de equilação do exame regular. Isso significa que os resultados são comparáveis, sem vantagem ou desvantagem para ninguém. O Inep garante que a nota de um candidato da reaplicação não prejudica a de quem fez o exame nos dias originais.
O que o Inep planeja para 2026?
O Inep estuda criar um canal de emergência para desastres naturais, permitindo reaplicações parciais ou flexíveis em casos como o de Rio Bonito do Iguaçu. Também há propostas para aceitar pedidos de reaplicação por falhas técnicas durante a prova — como falhas no sistema biométrico. A ideia é tornar o exame mais humano, sem abrir espaço para abusos. Ainda não há prazo, mas a pressão social está crescendo.
Bruno Rakotozafy
dezembro 18, 2025 AT 17:14